quinta-feira, 14 de junho de 2012

Autobiografia de Bertrand Russell


Autobiografia de Bertrand Russell (Prólogo)

Três paixões, simples mas irresistivelmente fortes, governaram minha vida: o desejo imenso de amar, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão pelo sofrimento da humanidade. 

Essas paixões, como os fortes ventos, levaram-me de um lado para outro, em caminho caprichoso, para além de um profundo oceano de angústias, chegando à beira do verdadeiro desespero.

Primeiro busquei o amor, que traz o êxtase – êxtase tão grande que sacrificaria o resto de minha vida por umas poucas horas dessa alegria. Procurei-o, também, porque abranda a solidão – aquela terrível solidão em que uma consciência horrorizada observa, da margem do mundo, o insondável e frio abismo sem vida. Procurei-o, finalmente, porque na união do amor vi, em mística miniatura, a visão prefigurada do paraíso que santos e poetas imaginaram. Isso foi o que procurei e, embora pudesse parecer bom demais para a vida humana, foi o que afinal encontrei.

Com igual paixão, busquei o conhecimento. Desejei compreender os corações dos homens. Desejei saber por que as estrelas brilham. E tentei apreender a força pitagórica pela qual o número se mantém acima do fluxo. Um pouco disso, não muito, conquistei. Amor e conhecimento, até onde forampossíveis, conduziram-me aos caminhos do paraíso. 

Mas a compaixão sempre me trouxe de volta à terra. Ecos de gritos de dor reverberam em meu coração. Crianças famintas, vítimas torturadas por opressores, velhos desprotegidos – odiosa carga para seus filhos – e o mundo inteiro de solidão, pobreza e dor transformam em arremedo o que a vida humana poderia ser. 

Anseio ardentemente aliviar o mal, mas não posso, e também sofro. 

Isso foi minha vida. Achei-a digna de ser vivida, e vivê-la-ia de novo com a maior alegria se a oportunidade me fosse oferecida.







Bertrand Arthur William Russell, foi um dos mais influentes matemáticos, filósofos e lógicos que viveram no século XX. Político liberal, ativista e um popularizador da filosofia, Russell foi respeitado por inúmeras pessoas como uma espécie de profeta da vida racional e da criatividade.

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